quinta-feira, 14 de setembro de 2017

Crônicas de Jair Humberto Rosa











DOMINGO


Jair Humberto Rosa

Domingo de manhã, impreterivelmente às sete horas, ele estava na igreja assistindo à missa. Metódico e pontual, ele chegava sempre dez minutos antes, para acomodar-se sem incomodar ninguém.
Desde quando a mãe falecera, sentia-se impelido a dedicar-se à prática religiosa; enquanto ela vivia, pouco frequentava a igreja, limitando-se aos casamentos e batizados para os quais era convidado e, de vez em quando, lembrado pela mãe, dava o ar de sua graça em uma missa.
Não era um filho obediente, mas quando ela fazia um pedido que podia atender, esforçava-se. Porém com o falecimento daquela que tentara a vida toda fazer do único filho um praticante dedicado à religião, um desejo quase incontrolável o conduzia para o atendimento póstumo dessa exigência materna. Nunca se casou, nem teve filhos e até os cinquenta anos era frequentador pouco assíduo de casas de prostituição. Depois da morte da mãe, a apatia venceu o desejo, acomodou-se. A igreja, então, passou a ter mais significado, sendo uma das poucas relações sociais que exercia. Embora a missa de domingo de manhã sempre contasse com sua presença, frequentava também outras, sem, entretanto, ter o mesmo compromisso que assumira consigo mesmo em relação àquela que a mãe ensinara ser a principal missa rezada na Matriz.
Muitas vezes ia também no sábado à noite, aquela missa em que as mulheres compareciam mais bem vestidas, desfilando elegância. Já no meio da semana, ele era menos frequente nas celebrações religiosas.
Entregou-se à devoção e depositou todas as suas esperanças em Deus, na certeza de que seus problemas teriam uma rápida solução. Todo domingo ia à igreja para encontrar seu salvador, saía de certa forma aliviado, embora acordasse na manhã de segunda feira com a sensação de aperto na garganta, como se estivesse sendo asfixiado. A sensação persistia até a manhã de domingo.
Assim levava a vida, esperando a solução divina. Entretanto, à medida que o tempo ia passando, mais aumentava a angústia, e suas forças iam sendo minadas.
Até que numa tarde de domingo, a já frágil sensação de alívio conquistada na missa a que compareceu de manhã tendo desaparecido, sentiu que não tinha mais forças para persistir.
Cansado de esperar que Deus fosse livrá-lo da angústia, à tarde voltou à igreja, subiu as escadas da torre até o topo, resolvido a ir ao encontro d’Ele.






Nenhum comentário:

Postar um comentário

 
;