segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

A CRÔNICA DO MÁGICO REGRESSO    

*Saavedra Fontes

São poucos os que diante de uma gravura ou fotografia antigas sabem voltar ao passado, recolhendo com olhar astuto os hábitos e costumes de uma época remota. È preciso que tenham sido leitores contumazes, observadores atentos, e ouvintes de histórias contadas junto a velhos fogões a lenha nos tempos da infância. São pessoas que adoram fantasmas avoengos e herdaram, dessa forma, uma certa atração por museus e pesquisas históricas. É um dom, não tenham dúvida.
Muito mais raros ainda são aqueles de espírito sonhador e criativo, que conseguem se integrar aos personagens retratados, vivendo e revivendo cenas de maneira a regredir no tempo e no espaço com a desenvoltura da realidade permitida. Exatamente agora, tenho diante dos olhos uma velha foto da Praça da Matriz de um lugarejo do interior de Minas Gerais, no fim do século XIX, certamente. Seduzido, deixo-me levar pela imaginação, inexplicavelmente hipnotizado pelo momento retratado, cujas figuras vão adquirindo dimensão e movimento, passando umas pelas outras, indo e voltando no seu passeio voluntário. A maioria trajando roupa branca, calça e paletó de brim, camisa de algodão abotoada até o colarinho nu, sem gravata e com chapéu, a maioria descalça. Outros se destacam pela segurança percebida no porte e no trajar, têm o olhar festeiro de um domingo especial. Debruçado no sonho e na fantasia vi quando um negro, que segurava as rédeas de um burro, fez um sinal convidando-me a chegar. Mergulhei na foto...
Era o ano de 1886 e comemorava-se a festa do padroeiro do arraial, com missa e banda de música na porta da igreja para a retreta dominical. Escravas de saias longas, lenços brancos na cabeça, seguiam na retaguarda carregadas de hircismo e desconfiança. Acompanhavam a sinhá com cheiro de alfazema e que se abanavam nervosamente, sugerindo um ar de incerta nobreza. O leque fazia parte da elegância e servia para abrandar o calor, que as roupas sobrepostas da saia-balão provocavam. Os negros escravos acompanhavam os feitores com as melhores roupas que possuíam, mas sempre descalços. Uma negra velha, de cócoras, de vestido vermelho e turbante colorido na cabeça, fuma um improvisado cachimbo enquanto analisa as pessoas que passam. A terra vermelha pisada por muitos comprometia a limpeza das calças e dos vestidos festeiros.
Após a cerimônia religiosa um foguetório encheu o ar fumaça e a praça de enorme algazarra, levando ao delírio os moleques que deixaram as casas e as senzalas nas fazendas para curtir o dia santo. A aguardente servida pelo mulato Orozimbo, de boa qualidade, fora extraída do alambique de pedra sabão trazido de Ouro Preto pelos tropeiros da região. Sorvida lentamente por um jovem e rude negro liberto, despertou nele ambições de artista, cantando e dançando de forma caricata, levando o povo às gargalhadas. Uma roda de coronéis confabulava sobre negócios e política. O pároco chegou à porta da igreja e sorriu vitorioso, uma jovem e bonita caiapó acompanhou-lhe os passos de certa distância, tímida e desencorajada pelos olhares dos fieis, que a tinham como companheira ilícita do padre italiano. Súbito, um negrinho esperto pousou os olhos em mim e notou que eu era diferente. Trajado de bermudas longas, camisa do Flamengo e óculos escuros, acabei por chamar a atenção de todos, que me rodearam curiosos. E passaram a me tocar. De repente, um empurrão, um puxão aqui outro ali e senti-me prisioneiro do passado. No presente a campainha sempre estridente de minha casa toca. Foi o bastante para que eu me despertasse escapando, renunciando a festa e voltando aos dias atuais. No portão aguardava-me um antigo pedinte, alcoólatra, querendo uns trocados. Era negro e um perfeito sósia do Orozimbo. Aquele, do século retratado.


Saavedra Fontes
saavedra_fontes@hotmail.com

domingo, 30 de dezembro de 2012

Tempo






TEMPO
(Arth Silva)

Já reparou em como o tempo passa e você nem vê? É como aqueles erros em filmes que quando te contam, você liberta um leve sorriso preso nos lábios e se pergunta: Como não vi isso antes?
Assim é o tempo, só nos damos conta dele quando já passou.
Quando você vê que seu Beatle preferido era o John e agora é o Paul. Quando você nota que a foto da sua carteira de identidade não se parece mais com você. (será falsificada?). Ou quando você destila a fatídica frase: No meu tempo era melhor.

Sempre digo que, se as fotos são o registro do corpo, a memória é a fotografia da alma. Tente relembrar um momento da sua vida. Lembrou? Reparou que você não se lembra necessariamente de uma imagem física, e  sim de um sentimento, de uma sensação? Há, você está novamente tentando se lembrar, só que agora fixando em detalhes. Não conseguiu, se conseguiu é a esquizofrenia se apoderando de você. Enfim. Acho que a lembrança é a única que enxerga realmente o tempo.

Quando crianças, pensávamos que o tempo era tão devagar, hoje ele parece mais rápido e amanha ele correrá mais que um keniano em prova de atletismo. A verdade é que quanto mais velhos, mais o tempo será breve. Para um cara de trocentos bilhões de anos, uma eternidade de evoluções químicas é realmente míseros seis dias e o dia de descanso deve estar durando até hoje. Mas se você ainda é daqueles que dizem que o tempo agora está passando rápido demais, entre em uma fila de banco que você irá mudar de ideia.
Olhando amigos e parentes, notamos que muitos mudaram completamente, outros parecem iguais, alguns se foram, outros ficaram.  Muitos que eram tão importantes para nossa vida, hoje estão mais sumidos que a mãe da Chiquinha. A maioria tatuou rugas sob os olhos, exceto aquela sua colega que você morre de inveja, mas não admite. No fim você se dá conta que não está sozinho. O tempo é contagioso, estamos todos envelhecendo. Somos feitos de tudo aquilo que sentimos, ouvimos, vemos, provamos e vivemos.

Para finalizar, certa vez li um sábio pensamento de um poeta conterrâneo (Eder Asa) que resume tudo o que eu disse aqui, no pensamento ele dizia: “Tempo logo existo”.
Reflita sobre isso enquanto ainda há tempo, antes que o ponteiro lhe empurre para o fim desse relógio.

Clique AQUI e leia mais texto insanamente lúcidos de Arth Silva

Crônicas do Luciano Vilela Teodoro


O cão está solto em Venda Nova 


*Luciano Vilela Teodoro

Ouvi rumores de que o capeta tinha aparecido num tal de vilarinho que era um bar que ficava nos subúrbios de Belo Horizonte e se recordo bem tinha uma pista de dança lá.

Era o ano de 1.990 eu estava na escola agrícolperto de Belo Horizonte, alguns colegas diziam que o capeta tinha bebida 53 cervejas das grandes e quando ele arrotou fedeu enxofre.

Até uma rádio FM de B.H. fêz uma musiquinha pro danadinho: "só quero dançar só mais um pouquinho lá no vilarinho não quero ser capeta não".

Ainda por cima inventaram um nome para ele: "Alex". Dizem que na hora dele tirar o chapéu deu para ver claramente seus chifres e deve ter grenado o tempo lá. Mais tarde descobriu-se que o "Alex" não passava de um alegre estudante norte-americano pensando por certo que o Halloween era por aqui ou se por acaso ele for o cão mesmo vocês não vão precisar de ir no inferno para ver coisa ruim, é só ir para os E.U.A.

Credo em Cruz, ainda bem que Deus é brasileiro.

Acadêmico da ALAMI - Cadeira 28
 
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