sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Cronicas do Saavedra

                                    








                        OS CAMINHOS DA DÚVIDA

Saavedra Fontes

Há muitos anos atrás eu me vi caminhando, sem sentido, pelo campo minado da dúvida. Nem a força da juventude conseguiu evitar o sofrimento. As respostas que eu queria não estavam em mim e procurá-las nos outros me parecia pouco confiável. A semente plantada em meu espírito pela minha mãe, na época de bom tamanho, aconselhou-me a orar. O problema é que as dúvidas começavam ali. Passei por caminhos tortuosos, procurei atalhos, evitei pedras e espinhos e segui. Algo me dizia que não devia parar ou me deixar vencer pelo cansaço. Cruzei com muita gente, igual ou pior do que eu passando pelo mesmo problema. O mais humilde de todos revelou-me o segredo: “- Não procure a verdade, ela por si só chegará até você”. A sabedoria e a verdade estariam com aqueles cuja simplicidade e modéstia no agir e no pensar são mais evidentes? Os livros sagrados de qualquer povo ou religião não exaltam os presunçosos, isto deve explicar alguma coisa.
Mas o que é a verdade? Pelo simples hábito de observar notamos que ela tem inúmeros significados e não é a mesma em cada um de nós. Para Tomás de Aquino ela é a expressão da realidade, isso explica em parte a dificuldade de traduzi-la de maneira absoluta. A realidade é mutante e no mundo globalizado como o nosso adquire formas particulares, sob o jugo constante da mídia sustentada pelo sistema capitalista. As religiões a define de acordo com os interesses de seus dogmas de fé, porque a crença é fundamental. A ciência a vê multifacetada, comprovando algumas e deixando outras para serem contestadas. Não existe a verdade absoluta,
A definição grega para a verdade é no mínimo curiosa, pois “aletheia” se traduz por aquilo que é visível aos olhos e à razão. Só que é muito pouco diante da nossa busca incessante o que podemos ver, se os problemas espirituais ficam concentrados na boa vontade de nossa fé e é um mistério. Talvez porque os gregos fossem artistas sua concepção de verdade fosse diferente. O pensamento prático dos romanos chamava a verdade de “veritas”, que em latim significa o que pode ser provado. Em hebraico “emunah” quer dizer confiança ou esperança de que o que será revelado virá por meio de Deus. Uma forma romântica e religiosa de transferir o problema.
Com o meu modesto cérebro levado a pensar, chego à conclusão de que a verdade é uma só, mas nos está sendo entregue em doses homeopáticas, de acordo com a evolução do homem e de suas pesquisas. Talvez Deus não tenha nada a ver com isso ou queira permitir, como Pai complacente e habilidoso, que a gente aprenda sozinho, apanhando, sofrendo ou descobrindo através dos privilegiados gênios da Humanidade.

Uma das grandes lições que levei na vida, ocorreu quando eu era ainda adolescente e rebelde. Fiz uma crítica, até certo ponto ofensiva, à crença que minha mãe depositava nos milagres de suas novenas a Santo Antônio. Naquele dia, ele havia prometido que no nono dia conseguiria a cura de uma epífora, uma retenção de lágrimas nos olhos de uma criança vizinha nossa, causada talvez pelo entupimento do canal lacrimal. Incrédulo, critiquei-a pelo fato de haver prometido que a cura ocorreria exatamente no último dia da novena. Cético, eu achava que poderiam ocorrer duas coisas: ou não surtiria efeito ou a cura poderia acontecer por vias naturais antes ou depois da data combinada. Levei o maior pito de dona Nenem, minha mãe, que não admitia que se duvidasse dos milagres de Santo Antônio. E não é que exatamente no nono dia da novena, pela primeira vez o menino acordou curado, de olhos bem abertos e sob os aplausos e a alegria de sua mãe. Descobri então que milagres existem e que as orações sejam elas de qualquer religião têm muito valor. Foi minha primeira verdade revelada.

sábado, 17 de outubro de 2015

Crônicas do Jarbas Avelar






Uma realidade oculta em grandes centros urbanos


          Jarbas W. Avelar

Quando estudante de Direito em São Paulo, voluntariamente me aproximei da instituição sem fins lucrativos, de âmbito internacional, Lar de Paraplégicos, que tem por objeto estatutário dar assistência a pessoas portadoras desta deficiência, bem como às suas famílias que, consternadas pelo infortúnio do parente enfermo, cercam-no de atenções e mimos em alguns casos em demasia, condicionando-o à permanente dependência, por obstruírem seu crescimento, seu progresso.
A instituição prioriza os grandes centros urbanos, onde o estresse e as interferências psicossociais exercem determinante influência nos sentimentos das pessoas, e, no caso de pessoas que têm parentes paraplégicos em casa, estas interferências são intensificadas pelo natural efeito, desgastante da longa convivência. Por precisarem da companhia constante de um familiar, conseqüentemente, privam-no de participar de eventos sociais e recreativos.
O desgaste causado por esta convivência altera o humor de todos da família. O sentimento de consternação é substituído pela sensação de que são punidos, sem que sejam culpados pela fatalidade de terem um paraplégico na família. Por sua vez, esta sensação evolui para ressentimentos, estágio que os faz se sentirem no direito de acomodar o parente paraplégico  que passou a ser um estorvo, num cômodo isolado da casa, sob o pretexto de lhe darem espaço privativo para nele viver a seu modo. Há casos em que ele é transferido para cômodos, nos fundos dos quintais, onde fica recluso. São recorrentes as denúncias de tratamentos desumanos.
Muito embora confirmados os maus tratos, há familiares que oferecem resistência a intervenções da instituição. Negam a existência do parente paraplégico, e dificultam o acesso. Vencidas a resistência e as dificuldades, os agentes credenciados assistem o paraplégico recluso; muitas vezes, em lugares sem as mínimas condições de higiene e salubridade, e ele se esconde ou avança, como um animal selvagem, tal seu estado de desordem mental.
Com autorização dos familiares, é levado para um Lar de Paraplégicos, onde passa a conviver com seus iguais. Em questão de dias, ele recupera sua auto-estima e se desperta para a busca de sua auto-suficiência; a exemplo dos demais. O Lar é administrado por seus moradores, sucessivamente, com gestões de um ano.
As mulheres se dedicam a afazeres domésticos, à confecção de roupas para crianças e ao artesanato: pintura em tecido, bordado, confecção de bijuteria, tiara... Os homens se voltam  para a fabricação, em madeira, de casinhas e mobílias para criança brincar, tamancos, para crianças e adultos, carrinhos de brinquedo... Nos fins de semana, promovem bazar para venda dos produtos às pessoas que os visitam.
 Lembro-me do morador de um dos Lares, que adaptou um carrinho de pipoca à sua cadeira de rodas, e de um fato, revestido de muita ternura: o nascimento de uma menininha, filha de um casal de paraplégicos; também moradores de um dos Lares. Ela encheu o Lar de alegria, energia e vitalidade.


*Jarbas W. Avelar
Advogado e Escritor                                                                                                                                                    



segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Crônicas da Regyna


                                




     Celisa Tavares das Neves




Os tempos mudam aventurando novos cenários, capítulos, enfim… mudam.
Bem eu sei, pois, vivenciei tudo. Eu vi passar os capítulos desta história.
Mas, por minha grã alegria, ninguém pode mudar uma história continuada no bem, graças a Deus…
Da nossa desventura, a perda não muda os tempos, nem os anos de alegria e aprendizado.
Ao pensar na tristeza da solidão,tenho por certeza que você CELISA, foi ao longo dos anos um ícone na educação,convertendo lindas crianças e jovens à sua natureza de cidadania.
Os leoninos (Escola Estadual Lions) em luto chora, pois, Celisa que amávamos se foi.
Com choro, lembranças, mas quem diz que chorar, lamentar, consola e descansa?
Há-de ter chorado e que as lágrimas sejam por igual gratidão e alento aos corações agradecidos, promovendo o descanso merecido.
Contudo olhos marejados de quem ama, choram mais que os de ninguém, que o que é para maior bem a história, “sua história” seja eterna e viva, tenho já para maior certeza a minha eterna gratidão.
Celisa, lágrimas manso a manso, lavam a alma de quem fica saudoso, desta eterna mestra do bem. Sempre de mãos postas acolhia a todos, com a voz mansa acalmava, com os passos lentos promoviam a paz e a delicada sabedoria na humildade.
Celisa, nossa referência como educadora, obrigada por ter permitido fazer parte da sua vida.
Que nossa gratidão te sirva de descanso eterno, nas escolas celestes, como uma história de cristal.


 
24/09/2015
Regyna Marques
 
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