sexta-feira, 5 de junho de 2015

Crônicas do Whisner Fraga







COM DESVIAR A ATENÇÃO DO EXPECTADOR PARA UMA CENA QUE NADA ACRESCENTA AO ROTEIRO

Whisner Fraga
 
Flagraram o deputado com o dedo no iPhone. O dedo no iPhone bolinando os peitos de uma atriz pornográfica durante uma sessão na câmara.
Ah, estou inventando. Não sei se era um iPhone. As imagens que vi do episódio estavam borradas. Propositalmente borradas. Também não sei se ele acarinhava, com a ponta do indicador, os peitos de uma atriz pornográfica. Não sei sequer se ele assistia a um filme pornográfico. A imprensa não foi muito convincente a respeito.
Mas o deputado olhava para a tela de um celular. Isso sim. E depois este deputado convidou para perto outros companheiros parlamentares, que atenderam ao chamado. A julgar pela atenção que dispendiam ao que passava na tela do telefone, podia se tratar sim de um filme pornográfico.
O assunto que era discutido pelos políticos era, de fato, enfadonho. Reforma política. Talvez os nossos representantes pensassem que se tratava de um jogo de cartas marcadas. Talvez nossos deputados estivessem cansados dessa brincadeira suja a que denominam política. Talvez nossos deputados sejam viciados em filmes pornográficos, só isso.
Parecia haver algo mais interessante para se fazer do que ouvir políticos se divertirem com reforma política. E se havia algo mais interessante para se fazer: ora, por que não?
Flagraram o deputado encarando a tela de um telefone celular. Ao que tudo indica, assistia a um filme pornográfico. Em vez de se aprofundar sobre o tema em votação, talvez de relevância para a sociedade, o repórter preferiu se ater a um filme pornográfico a que um deputado assistia. Me veio a curiosidade: o repórter que registrou a cena já viu algum filme pornográfico em seu horário e local de trabalho?
Flagraram um deputado rindo de Marin e da CBF, mas não do futebol, porque é torcedor devoto do Corinthians. A imprensa não noticiou.
Flagraram o deputado confundindo o botão do painel de votação com um botão do sistema operacional de seu celular. Dizem que o engano é frequente, dada a complexidade tecnológica dos aparatos da casa.
Flagraram o deputado confraternizando com seus amigos, enquanto Eduardo Cunha, que não congraçava com ninguém, mandava e desmandava na câmara. O assunto era desimportante: reforma política. Como foram desimportantes outros assuntos que passaram triunfalmente pela assembleia: maioridade penal e a lei das terceirizações.
Enquanto flagravam o deputado assistindo a um filme supostamente pornográfico, a câmara aprovava o fim da reeleição e a doação de empresas a partidos políticos. Eu acho que a imprensa apenas conseguiu, com a ajuda do deputado que via um filme pornográfico, desviar a atenção do povo para o assunto verdadeiramente irrelevante.



Crônicas da Marleida




Resgatando o Afeto


RESGATANDO O AFETO




Estamos vivenciando uma época de relações transitórias e superficiais. O ser humano está sozinho, embora rodeado de pessoas.
Houve um tempo em que ninguém tinha onde se colocar a sós. Sempre havia alguém disposto a narrar histórias mirabolantes e crianças interessadas em ouvi-las, com um brilho especial no olhar, para posteriormente tecer fantasias eternas em suas mentes descansadas.
Os indivíduos sentiam desejo em visitar, levando em sua bagagem um abraço ou uma palavra de conforto a quem, geralmente recebia com alegria, sentindo prazer em abrir a porta para os que chegassem, mesmo sem aviso prévio.
Havia disponibilidade para ouvir o outro, sem preocupar-se em dispor de escasso tempo livre para si mesmo e a solidariedade para auxiliar o próximo, sem aguardar retribuição.
As pessoas freqüentavam igrejas para orar, não visando solicitar bênçãos para um grupo tão restrito.
Há uma crise existencial na sociedade contemporânea. O cidadão está inserido em um ambiente letrado e tecnológico, porém estão prevalecendo as relações tumultuadas e traumáticas. Nunca os consultórios psiquiátricos foram tão requisitados como na atualidade. A família que serviu de espelho para os civilistas não existe mais.Os pais possuem direitos e deveres para com os filhos, no entanto na exercem mais o controle sociocultural e ético religioso deles. O mercado, a mídia, “os games”, a informática estão provocando o chamado pensamento acelerado. Os programas de televisão, a moda, os vícios estão ocupando as mentes, deixando-as poluídas, sobrecarregadas, cansadas!
A família está se dissolvendo gradualmente, o organismo familiar se esfacelou, parecendo ter perdido os padrões de referência e se tornando vulnerável aos novos conceitos psicológicos. Os pais demonstram estarem confusos como seres humanos, perderam a instabilidade das relações conjugais. Os filhos, por sua vez, sem controle, não vislumbram a direção.
Para compensar a falta de tempo, os progenitores buscam de todas as formas, mesmo sacrificando-se, satisfazer as exigências da prole, sem perceber que objetos de destaque na mídia jamais preencherão a lacuna da falta de carinho, atenção e de diálogo. Aquele que não consegue atender aos incessantes apelos dos filhos, pela ânsia do consumismo, sente-se angustiado, frustrado e até culpado diante da esdrúxula competição atual.
Este novo cenário doméstico tem criado adultos com dificuldades de impor limites. Crianças e adolescentes passam a maior parte do tempo diante do computador, da televisão ou conectado ao celular... Sozinhos! Egoístas! Não querem ser incomodados.
Ninguém consegue olhar fixo no olho do outro, quiçá por receio de visualizar a sensibilidade alheia. É quase inexistente quem se sinta feliz em receber e ser um bom anfitrião, pois em seu parco tempo de lazer, não quer ser perturbado. Até as igrejas têm sido alvo de buscas por recompensas pessoais, que, quando não satisfeitas, provocam ausências.
Urge uma reflexão e uma conscientização por parte de pais e demais educadores para a necessidade de uma nova visão: a formação do caráter, a sensibilização dos sentimentos, a potencialização das virtudes, resgatando o afeto – que demonstra ser a mola propulsora das ações – o diálogo, o olho no olho, o respeito mútuo, a ética, procurando salientar esforços, elogiando, estimulando, motivando, descartando prováveis emulações e elevando a autoestima.
O indivíduo precisa ser olhado de forma holística e sentir-se acolhido, para que as relações nasçam no respeito ao espaço e ao papel de cada um em um ambiente equilibrado e, acima de tudo, feliz.
“Acima de tudo, porém, esteja o amor, que é o vínculo da perfeição.”
 (Colossenses 3:14)
Marleida Parreira Rocha - Educadora





 
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