segunda-feira, 30 de março de 2015

Cronicas de Whisner Fraga





PostDateIcon 23 de março de 2015



Whisner Fraga é escritor. 
Contato: whisnerfraga@gmail.com

Parece ser corriqueiro, acontece com todos: dormimos um dia, trabalhamos no outro, almoçamos, resolveu problemas, buscamos os filhos na escola e, de repente, se passaram quinze anos. Nessa brincadeira desfilaram prefeitos, governadores, deputados, presidentes e nos posicionamos segundo nossa cultura e nosso interesse. Amigos vêm e vão e nossa preocupação se concentra mais na família e nos colegas de trabalho. Nossos círculos se estreitam, esquecemos temporariamente os companheiros da infância, perdidos, como zumbis, no cotidiano.
Naquele dia meu amigo Joãozinho chegaria a São Paulo e combinamos que eu passaria mais tarde no hotel onde se hospedara. Nós, humanos, sempre falamos sobre o valor da amizade, mas o fato é que, depois de certo tempo, parece que pregamos para paredes e as paredes somos nós. Talvez seja a correria da capital, o cansaço, não sei. É como se não tivéssemos mais toda aquela disposição para cultivar as amizades. Então se passaram quinze anos, talvez, sem que nos encontrássemos, nós, que fomos como irmãos na infância.
Continuamos irmãos, é claro. Considero Dib, Merched também minha família. Não canso de dizer que parte de minha educação me foi passada por essa família libanesa, que tanto me ensinou. Aprendi com eles o amor aos animais, o respeito ao mais velho, a reverência à cultura de seu país, o apreço ao trabalho, à justiça. Aprendi muito mais e não tenho receio de dizer que parte do que me tornei devo a eles.
Fomos para um restaurante e lá, é óbvio, nos lembramos de como foi uma parte de nossas vidas. Não com aquele saudosismo doentio, mas com alegria. É bom encarar o passado como o que ele é: algo que passou e que deve ficar lá mesmo, para pesquisas eventuais. Muito do que passamos se perdeu: pessoas morreram, sumiram, foram tragadas por suas urgências, mas de alguma maneira ainda estão lá, no que viveram conosco.
Mas nada parecia superar as lembranças sobre futebol. Acordávamos às cinco da matina para jogar bola. Quando acordávamos, é claro. Muitas vezes eu não conseguia e chegava às sete, oito, para a pelada. Batíamos bola durante 8 horas seguidas, debaixo do sol escaldante de Ituiutaba. O Sílvio, diretor da escola Polivalente, amante do futebol, incentivava. Era sábado e ele nos deixava entrar – os colégios eram mais abertos à comunidade do que são hoje.
Ainda jogo. Dois dias por semana alguns colegas se reúnem aqui para uma pelada. Claro que agüentamos correr apenas uma hora, no máximo. Não temos mais aquele pique da pré-adolescência. Naquela quarta faltei ao compromisso para jantar com meu amigo. O futebol da memória foi mais empolgante do que o verdadeiro. Ficamos lá por horas, cada qual se lembrando de episódios daqueles anos 1980. Parecia que éramos vizinhos novamente e que as madrugadas de sábado seriam reservadas para as peladas no Polivalente.


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