segunda-feira, 7 de abril de 2014

Crônica do Saavedra



 

A CEGUEIRA DO HOMEM MODERNO –
Saavedra Fontes                                        
                
Às vezes nos perguntamos por que pessoas de extraordinário valor, exemplos de vida em sua época, têm menos notoriedade e são menos reconhecidas do que astros e atletas, que nada fizeram de importante para a Humanidade a não ser diverti-la, embalando-a no mundo dos sonhos e da fantasia. Seriam a vaidade e a ingenuidade inatas no Homem, sempre dispostas a iludi-lo, impedindo-o de ver que somos frágeis passageiros em fase de evolução, as razões dessa insensatez? Seria o Ser Humano tão recalcitrante nos seus erros, a ponto de não haver eliminado as raízes de sua queda do Paraíso? É característica nossa reconhecer as boas obras, enaltecê-las, aplaudi-las quando resultado de sacrifícios, mas sempre a colocamos como sendo normais e próprias do dever a ser cumprido. Tomamos conhecimento, gravamos na memória por imposição escolar, mas as esquecemos quase que em seguida, não as trazendo para o dia-a-dia.
Entretanto uma performance esportiva ou artística vence o tempo, atravessa os séculos através da memória histórica, sendo reprisada com relevância. Principalmente agora, modernamente, em função da mídia, transforma-se em algo inesquecível para ser imitado. É assim que homens notáveis como Oswaldo Cruz, Einstein, Sabin, Madre Tereza de Calcutá, o casal Curie e muitos outros são menos lembrados em nosso cotidiano, como exemplo para as crianças, do que o artista de cinema ou TV,  o astro de futebol ou qualquer outro esporte, que são eternamente endeusados. O homem de hoje só reconhece a fama e o dinheiro, o resto é tolice na sua concepção de vida.
Não há nada de ruim no fato de procurarmos racionalmente os prazeres da vida, mas não podemos ignorar a morte. Se não vejamos: o homem de fé tem consciência de seu futuro espiritual e acredita saber o que lhe espera depois de sua passagem pela vida; o materialista tem a certeza, como ateu que é que tudo acaba aqui mesmo, todavia entende por convicção e raciocínio lógico que tudo que fizer de bom ou de mau irá refletir no mundo do qual faz parte, atingindo-o por consequência.
A dedução correta é que devemos trabalhar para o bem comum, esquecendo nossas ambições pessoais, renovando a todo instante nossos ideais fraternos de aspirações de paz e de proteção ambiental, visando a nossa sobrevivência e a de outras espécies, que conosco habitam este planeta por enquanto exuberante e lindo. Não podemos continuar cegos ao que acontece em nossa volta, precisamos compreender que para nos salvarmos teremos antes que salvar nosso habitat, o ambiente em que vivemos, erradicando de nossos hábitos a tradição das guerras, a destruição das florestas, a poluição crescente, a pobreza nos países subdesenvolvidos, as desigualdades sociais.
Em mais de dois mil anos de civilização não houve um único momento de trégua ou paz duradoura no mundo em que vivemos. Andamos criando as nossas próprias tragédias, que para serem evitadas temos que estabelecer  uma mentalidade nova dentro de um código universal que una todos os povos, todos os credos, todas as raças num único projeto, o de mudar o mundo modificando as pessoas.
Fatos assustadores são reincidentes em todas as partes do globo terrestre, atingindo principalmente as crianças. O desemprego, o sistema educacional falido, as drogas, um verdadeiro inferno onde impera a violência e a perversidade, transformando nossos jovens em bandidos precoces. Podemos culpar a incompetência e falta de sensibilidade dos governos, mais preocupados com a rotina política que mantém os governantes no poder. Podemos acusar a omissão da família, entregue ao egoísmo e comodismo, não apontando os caminhos pelos quais os filhos devem manter-se atentos e firmes. Não podemos negar a frustração e o imobilismo do setor educacional, entregue às teorias ultrapassadas e sem o incentivo de um ideal latente.
Uma análise sincera nos colocaria todos no banco dos réus, pois na realidade somos todos culpados, permitindo a mudança de valores infectada pelos exemplos contínuos de corrupção e impunidade; pela disputa de mercado consumidor evidente nas religiões de massa, fazendo-as incapazes de manter a fé e a esperança nos seus adeptos; porque somos irresponsáveis toda vez que aplaudimos e permitimos o livre acesso às obras de alto poder corrosivo da moral, seja ela nos livros, nos jornais, nas revistas, nos filmes e na televisão; e permitimos o mau exemplo para os nossos filhos toda vez que agimos como animais num cio interminável; ou quando deixamos de oferecer uma palavra de conforto ou um gesto de solidariedade àqueles que precisam.
Enquanto tudo isso acontece exemplos de valores menores ganham destaque em detrimento dos de maior amplitude, graças aos interesses comerciais dos meios de comunicação com alto poder de penetração, explorando o sensacionalismo e o escândalo como forma de superar a concorrência. A vida passa a ser um espetáculo de vaudeville, aparentemente alegre, sem sentido, banal, para simplesmente ser levada enquanto o coração e os pulmões a suportarem. Alternam-se os atos com a mudança da moral e dos costumes, como se a experiência particular de cada autor refletisse uma verdade única insofismável, que vai atingir acintosamente a maioria simplória, triste e despreparada da população. ###

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