segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Crônicas de José Moreira



Sociedade do medo 
José Moreira Filho


 Há um sentimento que se avoluma cada dia mais na sociedade moderna, um sentimento nefasto para o qual parece não haver antídoto. Manifesta-se em todos os níveis sociais e por mais sofisticadas que sejam as parafernálias de segurança, não bastam para saciar seus efeitos. Chegamos ao ponto de em uma manhã bonita ao raiar do sol, olharmos para o céu e incrédulos nos perguntarmos: onde está Deus?
Na verdade, nosso ceticismo não é em relação a Deus propriamente, pois se cremos nele sabemos da perfeição da sua obra, perfeição essa que inclui o livre arbítrio do homem, que é onde está o caminho que tem sido traçado e que parece conduzir a humanidade cabalmente para o caos. Assim muda-se a pergunta: onde está o homem? Essa questão nos lembra Diógenes de Sinope, o filósofo grego que a plena luz do dia andava pelas ruas de Atenas com uma lanterna acesa, dizendo estar à procura de um homem honesto. Pois, infelizmente, essa obra que parece prima pela beleza, pela perfeição estética e pela razão, foi manchada pelo mau uso da liberdade. Aí, o plano da criação, que tem como objetivo a felicidade, rompe-se por conta da ingênua certeza da infinitude, que por sua vez conduz o homem à ganância, ao culto aos bens materiais, aos prazeres mundanos, caminho horizontal que alarga a quantidade, mas que definha a qualidade e cega a visão vertical que nos levaria para o alto.
Esse aludido sentimento é o MEDO! Medo, que faz o policial ao sair para o trabalho, dizer não saber se volta. Medo que a estudante ao sair da escola noturna requer companhia. Medo do cidadão ao chegar em casa após o trabalho por suspeitar de assalto. Medo do trânsito, medo de doenças contagiosas, medo do terrorismo, medo da pedofilia, medo dos acidentes naturais, medo da homofobia e por fim medo do sistema.
Parece que até passamos a temer o medo. Na verdade, é um sentimento que nos acompanha desde que começamos a deixar o amparo das asas maternas. Daí temermos a professora, o padre, o pastor, o dentista, o patrão, o desemprego, o estranho e muitas circunstâncias da vida. Mas na formação dessa cultura do medo, a mídia tem muita responsabilidade. Como o crime dá ibope, a televisão explora esse viés da informação e acaba por banalizá-lo. Com isso retira da sociedade a indignação, a sensação do absurdo quando vemos um ser humano sendo assassinado, esquartejado e espalhado em lugares ermos. O medo fica recluso, a insatisfação contida e as mudanças necessárias emperradas. Embora fale-se do medo como tema central do século XXI.
Por tudo isso somos uma sociedade que vive junto, globalizada, mas que não caminha junto. Suplantada pelo individualismo, alimenta-se de egoísmo não admitindo diferenças, tornando-se, portanto, intolerante, agressiva e excludente.
Portanto, é razoável nosso medo, mas não aceitável. Não podemos aceitar que o outro seja um inimigo em potencial, até prova em contrário. Senão, o caminho é esse mesmo que estamos trilhando, fabrico de armas cada vez com maior poder de destruição. O tráfico desenfreado de drogas, armas e influências e políticas públicas embasadas no interesse de grandes glomerados financeiros.
Não há dúvida, se a vítima é a sociedade, é ela que precisa se organizar para controlar a violência em todos os sentidos. Requer ação urgente e planejada de ONGS, Clubes de serviços, Comunidade de bairros, etc. É o caminho para minimizar esse sentimento que só tem crescido, principalmente diante do desinteresse de muitas autoridades perante tal situação, bem como o desespero provocado pelo desemprego.


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