Um causo contado por quem sabia contar
*Jarbas W.
Avelar
O saudoso José
Marciano de Morais era fazendeiro, em Campo Alegre, agricultor, pecuarista,
oleiro, fabricante da famosa cachaça JM e reconhecido como notável caçador; na
época, não havia restrições legais para este tipo de lazer. Em um dos
recreativos e amistosos bate-papos, que habitualmente ocorriam em família,
recebeu a visita de Zeca Quirino, apelidado de gato, e de Antônio Franco, filho
do Senhor Alfredo Franco e de Dona Genoveva.
Zé Marciano contava
um de seus memoráveis causos, e muito bem contado por ser ele o protagonista,
enquanto Zuzu, Zulmira Carvalho, cuidava de afazeres domésticos, por perto. Ela
se casara, posteriormente, com Ostinho, irmão do Isac; creio que seu nome seria
Washington.
Seguindo seu estilo
pessoal, regado com espontaneidade e empolgação, Zé Marciano narrava uma de
suas caçadas, posicionado como se estivesse em uma tocaia. Na espreita, fazia
gestos como se tivesse a carabina em punho, apontada para um trieiro, por onde
a caça tinha por hábito transitar, deixando pegadas.
Enquanto articulava
seus comentários, enriquecidos com minuciosos detalhes, sentia-se um clima de
suspense no ar, com ansiosa expectativa pelo tiro, único e certeiro. Se
errasse, não haveria oportunidade para o segundo. A caça se assustaria e
fugiria em desabalada carreira pelo matagal.
Enquanto Zé
Marciano discorria, meticulosamente, Zeca Quirino, por ter uma certa “queda”
pela Zuzu, na época ainda solteira, não tirava os olhos dela, acompanhando sua
movimentação na lida doméstica.
Com a intenção de
advertir Zeca, que estava sendo descortês para com o anfitrião, por não prestar
atenção na história que ele narrava, Antônio, zombeteiro, em tom de
brincadeira, produziu o chiado, que se faz com a boca: “chiiiip! ”, quando se
quer espantar um bichano, já que Zeca tinha o apelido de gato.
Zé Marciano não se
deu conta da presença de Zuzu, tampouco das atenções de Zeca voltadas para ela.
Entendeu que aquele “chiiiip” se tratava de uma contribuição de Antônio para o
desfecho da história. Assim, em absoluta e intensa concentração, e absorvido
pelo cenário da narrativa, com o dedo indicador, pressionou, transversalmente,
os lábios gesto de quem pede silêncio e respondeu baixinho, para não
afugentar a caça, prestes a aparecer: “Antonce, ainda num tá na hora de
atirá”.
*Jarbas W. Avelar
Advogado e Escritor
*Jarbas W. Avelar
Advogado e Escritor
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